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“Trabalhadas no feminino”: um estudo sobre corpo, desejo e prostituição travesti em Fortaleza‐CE


Resumen

Este trabalho toma como foco de análise travestis que se prostituem na cidade de Fortaleza‐Ce. São apresentadas narrativas sobre suas transformações corporais, experiência que engloba um conjunto de processos e vivências. Contrastando com concepções de identidades que privilegiam a coerência e a linearidade, apresento trajetórias e relatos autobiográficos contextualizados por descontinuidades. Travestis efetuam transformações em suas formas físicas, seja com o aval da medicina legal ou na clandestinidade. Entendemos que a utilização destes corpos como objeto de desejo expostos nas “ruas” vai além das discussões que permeiam a travestilidade como uma realidade estigmatizada. No trabalho de campo, mobilizei ferramentas metodológicas que permitiram a apreensão de singularidades e de expressividades concernentes à complexa experiência de tentarem “passar por mulher” vinte e quarto horas por dia.


Palabras clave: travestilidade; transformações corporais; gênero; ritual; performance


Abstract


This work takes as its focus of analysis transvestite prostitutes in Fortaleza, Brazil. Are presented narratives about their body transformations, an experience that includes a set of processes and experiences. In contrast to conceptions of identity which emphasize coherence and linearity, I present autobiographical trajectories and reports contextualized by discontinuities. Transvestites make transformations in their physical shapes, whether with the endorsement of the medicine or clandestine manner. I understand that the use of these bodies as objects of desire displayed in the "streets" goes beyond the discussions that permeate Travestiler as a stigmatized reality. In the field work, I mobilized methodological tools that allowed the apprehension of singularities and expressiveness concerning the complex experience of trying to "Live as a woman" twenty‐four hours a day.


Keywords: travestiler; body transformations; gender; ritual; performance



Introdução


Eu tenho uma espécie de dever, dever de sonhar, de sonhar sempre, pois sendo mais do que um espetácu‐ lo de mim mesmo, eu tenho que ter o melhor espetá‐ culo que posso. E, assim, me construo a ouro e sedas, em salas supostas, invento palco, cenário para viver o meu sonho entre luzes brandas e músicas invisíveis (Fernando Pessoa).Esta comunicação é fruto da minha dissertação de Mestrado intitulada “A saga da beleza: um estudo das transformações corporais na ‘experiência travesti’”, defendida no Programa de Pós Graduação de Sociologia da Universidade Federal da Paraíba ‐ UFPB.


Durante a pesquisa de campo foram registra‐ das em meu diário de campo muitas histórias de lu‐ ta e determinação entrelaçadas por dores, risadas e mutilações. Todas elas com muitas assimetrias, mas com muitas singularidades: as transformações cor‐ porais, a construção de uma nova identidade de gênero1 (Bento, 2006) e a busca incessante por corpos canônicos e desejáveis.Shopping Center, bares, botecos, centro comercial da cidade, boates, ruas escuras e avenidas por onde as travestis2 costumeiramente se prostituem..., São esses os ambientes que compõem parte da coleta de dados da minha pesquisa. Ter em mãos o diário de campo e um gravador era indispensável, a qualquer momento algo novo e interessante po‐ deria se configurar em minha frente, mesmo com‐ preendendo que nem sempre esses instrumentos (diário de campo e gravador) são apropriados. Paralelo à realização da observação flutuan‐ te (Goldman, 1995)3, comecei a articulação de um grupo focal a partir de contatos estabelecidos na Associação das Travestis do Ceará – ATRAC; de vários telefones capturados esporadicamente na noite gay, principalmente na mais antiga boate gay em funcionamento,4 como também das minhas idas no‐ turnas às ruas do centro da cidade e a uma grande avenida de Fortaleza, territórios onde a prostituição travesti “domina”.


NOTAS:


1. Na sociologia, identidade de gênero se refere ao gênero com o qual a pessoa se identifica (se a mesma se identifica como sendo um homem, uma mulher ou se a mesma vê a si como fora do convencional), mas pode também ser usado para referir‐se ao gênero que certa pessoa atribui ao indivíduo tendo como base o que tal pessoa reconhece como indicações de papel social de gênero (roupas, corte de cabelo, etc.). Do primeiro uso, acredita‐se que a identidade de gênero se constitui como fixa e, como tal, não sofre variações, independente do papel social de gênero que a pessoa se apresente. Do segundo, acredita‐se que a identidade de gênero possa ser afetada por uma variedade de estruturas sociais, incluindo etnicidade, trabalho, religião ou irreligião, e família. Vale destacar que identidade de gênero não apresenta uma relação direta com a sexualidade. Para mais informações acerca de identidades de gênero, ver Bento, Berenice (2006).

2. Assim como Larissa Pelúcio (2007) e Marcos Benedetti (2005),

decidi assumir o emprego do substantivo travesti classificado dentro do gênero gramatical feminino. Existe um processo em construção do gênero feminino no corpo e na subjetividade que não podemos negar. Existe também todo um arranjo de cunho político sobre a discussão da travestilidade, e o mais importante é uma reivindicação forte e presente nas falas das travestis entrevistadas.

3. Conforme Márcio Goldman (1995), “a observação direta econtínua se transforma em ‘observação flutuante’, semelhante à ‘escuta flutuante’ do psicanalista: o observador está sempre em situação de pesquisa, sua atenção podendo ser exigida a qualquer instante”. A opção por esse tipo de observação me deixa à vontade pelo fato da não‐necessidade de “morar” com os indivíduos que irei investigar. Ademais, sou pesquisador e morador da cidade. Esses fatores não são únicos, acrescente‐se ainda que sou freqüentador de alguns espaços LGBTT (gays, lésbicas, bissexuais, travestis e transexuais), boates, bares etc. Enfim, quero aqui chamar a atenção para o fato de o pesquisa‐ dor participar de determinadas práticas dos seus colaboradores por habitar a mesma cidade e também construir nela seus refe‐ renciais.

4. A rotatividade de espaços LGBTT em Fortaleza é enorme, sãoraros os espaços que conseguem se consolidar durante muitos anos no mesmo local ou com o mesmo proprietário e nome fantasia. A boate Divine localiza‐se no centro da cidade, e é a única que há mais de dez anos vem conseguindo se manter, reunindo um grande público trans, principalmente de travestis e transformistas.


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